Pensando Alto Sobre os Festivais de Apartamento


Esse texto faz parte da dissertação de mestrado

políticas e poéticas das fotografias do FESTIVAL DE APARTAMENTO: entre evidências e devires

que pode ser lida na íntegra na janela incorporada no final desse post.

"Pausa para o vinho e o cigarro" ou "Pensando alto sobre os FESTIVAIS DE APARTAMENTO"

por Rodrigo Emanoel Fernandes


O inferno dos vivos não é algo que será; se existe, é aquele que já está aqui, o inferno no qual vivemos todos os dias, que formamos estando juntos. Existem duas maneiras de não sofrer. A primeira é fácil para a maioria das pessoas: aceitar ó inferno e tornar-se parte deste até o ponto de deixar de percebê-lo. A segunda é arriscada e exige atenção e aprendizagem contínuas: tentar saber reconhecer quem e o que, no meio do inferno, não é inferno, e preservá-lo, e abrir espaço”. (CALVINO; 1990, p.150)

Um fragmento de tempo do VII Festival de Apartamento, em São José do Rio Preto:

Na performance “Não quero mais morrer, não quero mais matar”, Flávio Rabelo apropria-se de uma proposta de ação de Thaíse Nardim e convida os presentes para que arremessem corações de boi em seu corpo. A cada golpe, sendo doloroso, o performer removeria uma peça de roupa. Num certo momento, a performer Charlene Sadd segura um dos corações nas mãos, mas não o arremesa. Ao invés disso, com expressão de asco, discursa sobre as crueldades às quais são submetidos os animais, fala da necessidade da adoção do vegetarianismo para uma manutenção saudável da saúde física e uma mudança de atitude frente à natureza. Depois, rangendo os dentes, arremessa com força o coração, atingindo Flávio bem no peito.

O episódio é representativo de uma interessante característica dos Festivais de Apartamento: a pluralidade de discursos, agendas, interesses, causas defendidas e inimigos eleitos por cada um dos participantes. Em suma, os múltiplos processos de subjetivação que convivem e se confrontam no interior da proposta do festival. No caso houve um confronto direto entre duas sensibilidades distintas, entre uma expressão poética que se utiliza de um órgão de um animal morto e um posicionamento político de defesa e proteção aos animais. O desenlace é irônico, uma espécie de impasse expresso em ação, talvez um empate técnico: o trabalho de Flávio é interrompido e problematizado por uma intervenção veemente, porém, ao mesmo tempo, a postura ativista cede e participa da proposta poética da performance, ainda que resignificando-a.

O traço comum entre os diferentes processos de singularização é um devir diferencial que recusa a subjetivação capitalística. Isso se sente por um calor nas relações, por determinada maneira de desejar, por uma afirmação positiva da criatividade, por uma vontade de amar, por uma vontade de simplesmente viver ou sobreviver, pela multiplicidade dessas vontades. É preciso abrir espaço para que isso aconteça. O desejo só pode ser vivido em vetores de singularidade”. (GUATTARI, ROLNIK; 2008, P.56)

O ponto a destacar é que um micro-acontecimento se deu na sobreposição de processos de subjetivação distintos, afrontados por duas singularidades que se chocaram e se imiscuiram a um só tempo. O Festival de Apartamento está repleto de confrontos de natureza semelhante e "contradições" em todos os níveis, desde o uso de um nome e uma idéia provenientes do movimento neoista, apesar de nenhum dos organizadores ser propriamente simpatizante dos posicionamentos políticos do neoismo, até a postura de não selecionar de forma curatorial as performances inscritas, mesmo sabendo que, de uma forma ou de outra, existem inúmeros juízos de valor em atividade no conjunto de afetos formado pelo festival em si. Mas essas contradições não são vivenciadas como traumas, como problemas a serem resolvidos (a não ser em momentos e aspectos pontuais), mas sim como uma parte intrínseca da forma como os festivais se desenvolveram: não há uma agenda política explicitada, nem um inimigo definido a combater, ainda que várias agendas tenham sido defendidas e inimigos apontados em diferentes ocasiões, de diferentes formas, por diferentes motivos, sem nunca se manter.

Mesmo o fato de se apresentar como uma alternativa às instituições de arte convencionais não torna o festival (ou seus organizadores, ou seus participantes, ou seus colaboradores) necessariamente adversários das instituições, dos mecanismos tradicionais de apreciação, valoração e comercialização da arte, ou mesmo dos processos de subjetivação capitalísticos a priori. Existem fases, momentos, situações em que essa postura é assumida (com diferentes níveis de sinceridade), mas não se pode afirmar que seja uma característica fundamental para a continuidade dos festivais sem talvez incorrer numa falácia.

Muitos performers que participaram dos festivais também participam de mostras institucionais, premiações, mídia, não necessariamente com as mesmas formas de expressão ou poéticas, e não necessariamente encarando isso como alguma forma de contradição. Entre os organizadores (e ex-organizadores) vários são acadêmicos, ou atuam em instituições culturais, trabalham (no sentido capitalista do termo) com arte e expressão artística, já foram premiados em mostras e eventos tradicionais, ao mesmo tempo em que defendem que o festival se mantenha como uma ação sem fins lucrativos e sem curadoria. O festival em si já passou (e, provavelmente, passará) por inúmeros devires-institucionais. Hesitou-se por muito tempo em pedir que as inscrições fossem feitas com o preenchimento de fichas, hesitou-se mesmo em chamá-las de inscrições. Em pelo menos duas ocasiões, discutiu-se a possibilidade da realização de um festival com financiamento de órgãos públicos e o fato da idéia ter sido vetada não significa que não voltará a se apresentar no futuro. Mas ainda que haja essa resistência ao devir-institucional não seria verdadeiro dizer que o festival é adversário das instituições.

O devir do festival não é de negação, mas de afirmação. O motor desse processo de singularização em particular é o agencimento do desejo. Num sentido prático e direto, a maior parte das decisões tomadas a cada etapa do desenvolvimento das estratégias do festival foi norteada por um princípio hedonista: qual das opções apresentadas é potencialmente mais prazerosa? Esse princípio, mais do que qualquer outro, barrou certas partes do devir-institucional e abraçou outras: obter financiamento de um órgão público exige a elaboração de projetos de acordo com os critérios que tais órgãos endossam, exige prestação de contas, lidar com cronogramas, burocracia, metas estabelecidas de fora pra dentro. Desprazer. Nove festivais foram realizados sem a necessidade de empenhar energia com nada disso, o que por si só é uma afirmação e um estímulo. Por outro lado, adotar fichas de inscrição, determinar certos regulamentos (como a regra de que cada performer deve ser responsável pelos equipamentos eletrônicos que pretende utilizar), selecionar e organizar fotos e registros, tratar com rigor a divulgação correta de dados pessoais e de trabalho que o performer deseja ou não divulgar, são elementos institucionais (inclusive burocráticos) que tornam o trabalho necessário para manutenção e continuidade do festival ou mais fácil ou, de algum modo, mais prazeroso. E se ainda existe o desejo das diversas pessoas envolvidas, sejam organizadores, anfitriões, performers ou colaboradores, em dar continuidade aos festivais, o motivo que mais se apresenta como determinante é o potencial de satisfação, de prazer, antecipado num nível pessoal. Quando o festival não mais é vivenciado como prazeroso, as pessoas simplesmente o deixam para trás.

Esse princípio hedonista assume muitas formas, pois sua principal expressão é individual. A performance art é uma linguagem artística marcantemente atravessada por um devir-individualista, pois sua principal matéria prima são as marcas impressas pelo tempo nos corpos dos performers. Uma performance não raro é a eclosão de um ovo do tempo, no sentido dado por Suely Rolnik (1987), ou ao menos uma tentativa, vivenciada de formas muitos pessoais, sendo esse um dos fatores que tornam certos tipos de trabalhos e poéticas performáticas difíceis de converter em mercadoria para ser embalada numa casa de espetáculos e vendida com ingressos. Como produto para consumo tais formas de expressão são problemáticas pois sua razão de ser não passa, necessariamente, pela intenção de corresponder a qualquer expectativa de um público entendido como consumidor. É mais correto dizer que o público é que se submete a uma expectativa do performer. A fruição de obras artísticas dessa natureza exige do público uma abertura, uma espécie de entrega, entregar-se à experiência (no sentido pretendido por LARROSA, 2002), ainda que isso envolva aspectos vividos como desagradáveis (como arremessar um coração de boi, ainda que não se suporte a idéia de violência contra animais), mas mesmo nisso pode existir uma forma ambígua de prazer.

Não por acaso são raros os grupos de performance. É muito difícil que as marcas de um corpo se harmonizem tão bem com as de outro(s) de modo a acharem uma forma de expressão comum. Equipes de perfomance tendem a se distanciar dessa forma de eclosão íntima, projetando-se para as expectativas do público, seja para seduzir com o espetáculo ou convencer de uma agenda, causa ou idéia. É comum que a poética do grupo centre-se em um de seus integrantes, elevado a categoria de líder. Ainda mais comum é que os grupos não durem muito tempo, com diferentes níveis de conflito envolvido no processo de rompimento ou, mais comumente, os grupos se aceitem efêmeros: livre associações de performers que executam um ou mais trabalhos em conjunto para depois se desfazer. Novamente, há aqui um princípio hedonista: quanto maior o prazer da experiência, mais chance da associação se repetir de alguma forma.

Da mesma forma os festivais se repetem. Sempre houve o desejo de que se repetissem, como expressam os numerais romanos presentes desde o começo. Mas o que garante esse retorno é o fato de que, até hoje, as chamadas não permaneceram sem resposta. A proposta tem feito sentido para um número de pessoas suficiente para que cada evento seja vivenciado como satisfatório, alimentando a expectativa pelo seguinte. Para usar um termo capitalístico, há uma demanda, que reafirma o ritornelo.

O ritornelo tem três aspectos, e os torna simultâneos ou os mistura: ora, ora, ora. Ora o caos é um imenso buraco negro, e nos esforçamos para fixar nele um ponto frágil como centro. Ora organizamos em torno do ponto uma "pose" (mais do que uma forma) calma e estável: o buraco negro tornou-se um em-casa. Ora enxertamos uma escapada nessa pose, para fora do buraco negro (DELEUZE; GUATTARI, 1997; p.117)

Uma casa cedida/selecionada é fixada temporariamente como um centro. Através dos mecanismos de interatividade do ciberespaço é organizada uma “pose” que torna essa casa um “em-casa”, onde será possível “performar”, romper o cotidiano, experienciar, eclodir ovos. Depois, se abandona esse ponto para retornar ao clamor do caos, às suas múltiplas exigências, porém com uma diferença: a consciência de um possível abrigo, ainda que frágil e incerto, onde potencialmente se poderá retornar. O festival abre um espaço, gera uma diferença, mas não se pode existir em definitivo no ritornelo ou este deixará de sê-lo. É preciso retornar ao caos.

É um provável equívoco pensar no festival como algo que promove a criação de vínculos duradouros entre as pessoas, ainda que faça parte de seu discurso (do mesmo modo que as performances não solucionam as carências e anseios íntimos que as motivam). De modo geral os vínculos começam e terminam no próprio acontecimento (entre a chamada divulgada, o festival em si e a publicação do registro). Não permanecem, dissipam-se no caos. O festival não é uma solução. É sim a criação de um espaço social nos interstícios dos processos capitalísticos, que não se mostram adequados para dar conta de tais devires, mas tentar sustentar esse espaço e mesmo os afetos que se manifestam através dele para além do espaço/tempo do acontecimento em si tende a desfazer sua força, dissipar sua vivência como diferença, tornar-se norma. Parte da potência do festival está justamente no fato de que ele não se repete com freqüência e, no limite, sequer existem garantias inquestionáveis de que se repetirá. Apenas intenções expressas no discurso mantido virtualmente no ciberespaço. Há uma tentativa de equilíbrio: o acontecimento é fugaz, o retorno não-garantido, a materialidade e continuidade das relações e afetos são incertas, porém o endereço virtual é fixo: http://festivaldeapartamento.blogspot.com. Nas fotos e vídeos das performances, no discurso, sustenta-se a promessa (não certeza) de continuidade.

Como o Clube da Luta, do filme de David Fincher, que só existe como virtualidade entre os momentos em que se atualiza como acontecimento. “Não se fala do Clube da Luta”, diz a primeira (e a segunda) regra desse ritornelo, no entanto a cada novo encontro novos rostos estão presentes. No blog do Festival de Apartamento quase não há comentários. Entre a publicação de um registro e a divulgação de uma chamada, a troca de mensagens escasseia até praticamente cessar. Não existe a regra “não se fala no Festival de Apartamento”, no entanto o silêncio está lá. De algum modo faz parte desse processo de singularização. No entanto, há seguidores conectados ao blog, ainda que não se manifestem, há seguidores no twitter dedicado ao evento, ainda que quase não haja twits nos períodos entre-festivais, o marcador de visitas alocado no blog aponta diariamente locais onde os registros são atualizados: em Salvador, em Porto Rico, em São Paulo, em Campinas, em Palmas, em Lisboa, etc., etc.. Fala-se no Festival de Apartamento? E a cada chamada, rostos desconhecidos se apresentam.

As imagens adensam em si a efemeridade do acontecimento. As imagens se querem como o próprio acontecimento. Novamente há o princípio hedonista, o prazer narcísico. Os performers desejam suas imagens, ainda que a efemeridade da performance seja parte de sua potência. Os organizadores também desejam se identificar com as imagens, identificar-se com o festival em si. No peso de realidade associado à fotografia, o festival se apresenta como realidade, localizável no tempo/espaço e repetível. Os performers reafirmam a realidade de sua expressão, ao materializarem nas telas de seus computadores os momentos capturados por outros olhos, onde podem reconhecer suas marcas, re-experimentar (re-significar) a eclosão de seus ovos. Ao acessar o blog do festival é possível construir narrativas, independente de ter estado ou não presente no momento do evento (como as fotos do conflito entre Charlene e Flávio que, em si mesmas, propiciam interpretações, histórias, geradas a partir de uma amálgama de escolhas: a escolha de Flávio de quais fotos desejava publicar ou não, a escolha dos organizadores ao justapô-las, a escolha do internauta de como lê-las).

O festival se apropria do status de realidade das imagens. Assim como se apropriou da criação neoista, ou dos mecanismos de marketing na internet que potencializam as ações de caçada e pilhagem (LEVÍ;1999, p.85) – como o uso estratégico de palavras-chave para direcionar os mecanismos de busca de modo a direcionar tanto o acesso de quem procura especificamente pelo festival em si, quanto “capturar” a atenção de “pára-quedistas” genericamente interessados em performance, arte, eventos alternativos) – ou mesmo as estratégias e ferramentas da arte ativista, deslocadas dos contextos político/artísticos nos quais foram originalmente propostas. E talvez não haja forma melhor de justificar as apropriações de todos esses elementos senão o fato de que “estão lá”, disponíveis. São “possíveis” que se tornam ferramentas para o agenciamento dos desejos. Da mesma forma o festival, enquanto processo de singularização, se torna um possível para ser apropriado por outrem (nem sempre numa forma de acordo com os desejos da organização em si, independente de suas tentativas de controle). Nesse sentido, o festival guarda mais intimidade e correspondências com a dinâmica de movimento social e político do ciberespaço em si do que com as redes de movimentos arte-ativistas (muito mais antigas do que a internet) aos quais, a princípio, estaria filiado.

O universal da cibercultura não possui nem centro nem linha diretriz. É vazio, sem conteúdo particular. Ou antes, ele os aceita todos, pois se contenta em colocar em contato um ponto qualquer com qualquer outro, seja qual for a carga semântica das entidades relacionadas” (LEVÍ;1999, p.111).

O Festival de Apartamento é similar a quaisquer outros processos de construção de redes no ciberespaço nos quais coletivos se formam e desfazem, a partir de iniciativas individuais ou não, sob um princípio de prazer comum que não se coaduna com tranqüilidade com os processos de subjetivação capitalísticos. Exemplos possíveis são as redes de praticantes de sado-masoquismo, não raro estruturadas, assim como o festival, em blogs, redes sociais e atualizações em mostras/festas que se constituem como um (novo) espaço social no qual processos de subjetivação diferenciados da sexualidade dominante encontram suas formas de expressão. Ou as redes de disponibilização de conteúdo pirata através de fóruns privados, redes p2p, blogs e troca direta de arquivos, que envolvem intrincados agenciamentos para upload e organização de arquivos, tradução e sincronização de legendas, com uma rapidez impressionante e, muitas vezes, com qualidade superior do que os produtos oficiais (embora tal nível de excelência não seja determinante para a continuidade do processo). Nesse caso em particular, embora existam integrantes nessas redes que defendam posturas políticas definidas em relação a questões como direitos autorais, estas não são tão determinantes para a continuidade do processo quanto o prazer (declarado) do compartilhamento em si, com a conseqüente criação de redes diferenciadas de convívio social online, onde o princípio de valorização se dá pelo prestígio atribuído a nicknames individuais ou coletivos.

Há muitos riscos envolvidos nessas formas de organização. Como já mencionado, o festival poderia se perder num devir-institucional, sendo recuperado pelos processos de subjetivação capitalísticos e perdendo sua potência como um espaço social diferenciado. Bastaria que o princípio hedonista que regula as alianças que compõem o evento se voltasse para formatos habituais de lucro e consumo: eventos patrocinados, disputas por formas de financiamento, cachês, salários, formas de prazer já bem inseridas nos processos capitalisticos. Organizadores, colaboradores e performers repentinamente incapazes de determinar se sua continuidade no evento ainda é determinada pela expressão de suas marcas e desejos ou meramente pelas leis de mercado e sobrevivência. O que diferenciaria o festival, então, dos formatos políticos/sociais aos quais se apresentou como uma alternativa em primeiro lugar? Por outro lado, tal situação abriria outros possíveis, para processos de subjetivação que Festival de Apartamento talvez não seja capaz de satisfazer.

Há sempre algo de precário, de frágil nos processos de singularização. Eles estão sempre correndo o risco de serem recuperados, tanto por uma institucionalização, quanto por um devir-grupelho. Pode acontecer de um processo de singularização ter uma perspectiva ativa em nível do agenciamento e, simultaneamente, a esse mesmo nível, fechar-se em gueto”. (GUATTARI, ROLNIK; 2008, P.62).

O devir-grupelho atravessa o festival desde o início, com fases de maior ou menos presença, ao sabor das circunstâncias. O contra-balanço ao devir-grupelho acaba por ser a própria necessidade de conciliar as múltiplas individualidades envolvidas no processo, no próprio princípio hedonista e no agenciamento de desejos, permanentemente atravessados pelos devires-institucionais, pelos devires-grupelho ou mesmo por um devir-revolucionário, que sempre traz em si o risco de se degenerar em um micro-fascismo (como o que acometeu os Clubes da Luta, embora o filme mostre que a assustadora organização, centralizada na figura do líder-mítico Tyler Durden, realmente conseguiu obter sucesso em desferir um golpe audacioso às infra-estruturas do capitalismo mundial integrado, deixando livre para o público decidir se o processo de singularização apresentado na trama era ou não algo desejável de ser vivido). O equilíbrio é sempre precário, os afetos são intensos, as tentativas de conciliação ambíguas, a lógica de adesão ao Festival de Apartamento passa pelo devir-animal: lida-se com uma matilha, com afetos de matilha, propagando-se por contágio (DELEUZE; GUATTARI; 1997, p.19-37), as conexões do rizoma fazendo-se e refazendo-se, desdenhando os devires-controle. Algo para se temer, algo para se apaixonar. Tudo sempre a um passo de, repentinamente, não mais existir, com um suspiro de alívio/frustração.

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